A cobiça, o consumismo e a bem-sucedida indústria da infelicidade.
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A cobiça, o consumismo e a bem-sucedida indústria da infelicidade.

Graham Blake é um empresário bem-sucedido, rico, admirado, belos filhos, ex-esposa leal, amante belíssima. Tem tudo o que faria um homem feliz, mas uma insatisfação somatiza-se em insônia, dores de

  • Publishedjaneiro 4, 2022

Graham Blake é um empresário bem-sucedido, rico, admirado, belos filhos, ex-esposa leal, amante belíssima. Tem tudo o que faria um homem feliz, mas uma insatisfação somatiza-se em insônia, dores de cabeça e perda da libido. Desesperado, submete-se a tratamento psicológico. Esse é o enredo do livro Terapia, que Ariel Dorfman escreveu para a coleção Plenos Pecados (Editora Objetiva), cujo tema é a avareza.

Ambição, cobiça, ganância e seus sinônimos, essa sede por ter mais e mais é o motor da ideologia do consumismo. Pela televisão, internet, outdoors ou redes sociais, os ideais do capitalismo nos inundam de propagandas a persuadir de que a felicidade está em consumir, exibir um carro novo, um iPhone último modelo, postar viagens maravilhosas. Tudo em nome de uma felicidade de prateleira.

No início da primeira parte do segundo livro de sua Summa Theologica, diz Tomás de Aquino que “o objetivo último da vida humana é a felicidade”. Para isso, concorrem a satisfação das necessidades do hoje, a segurança do futuro e os prazeres em geral.

Mas a felicidade cultivada pela ideologia capitalista é planejada para jamais ser alcançada. Vender mais implica satisfação passageira. Aquele último aparelho celular em pouco tempo já não satisfará: outro mais moderno será cobiçado. A ideologia da comparação, fundada na inveja e na cobiça, alimenta vontades e frustrações – não basta ser feliz; é preciso ser mais feliz do que o outro.

Utopia: a cada avanço, um novo distanciamento da vida desejada. Para vender mais é necessário que se fabriquem mais insatisfeitos. Uma mulher feliz com seu corpo não se sacrifica em tratamentos estéticos caríssimos; um homem feliz com seus bens não se martiriza por mais ganhos. Alain de Botton diz que o desejo de status possui capacidade excepcional de inspirar sofrimento. O consumismo se alimenta de infelicidade e insatisfação.

Blake tem tudo o que supostamente faria um homem feliz. Mas ele é o retrato da ansiedade e da frustração que nos consomem em aparências e antidepressivos. E vamos sorrindo nas reuniões sociais e sofrendo no trabalho cada vez mais moralmente exaustivo.

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Imagem: Freepic

Referências Bibliográficas:

AQUINAS, Thomas. The Complete Works of Thomas Aquinas (Catholic Publishing). Material compiled from Omaha-NE: Kindle Editions, 2018 (parte 2 do livro 2, questão 35, p.2667).

BOTTON, Alain de. Desejo de status. Tradução de Ryta Vinagre. Rio de Janeiro: Rocco, 2005

DORFMAN, Ariel. Terapia (Avareza). Tradução de Anna Olga de barros Barreto. Coleção Plenos Pecados. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999.

Written By
Gilberto Vitor

Escritor, pesquisador independente - Literatura, Filosofia, Linguística.

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