— Leu no jornal, coronel? Festa dos quarenta e cinco anos da Lei Áurea.
— Sim, viu? A escravidão era uma barbárie.
— Agora, sim, um país civilizado. Como a sua fábrica.
— Escravos empatavam muito dinheiro.
— E prejuízo, se o negro morria antes de pagar o investimento.
— Isso acabou. Preto, branco, sarará, agora é tudo de graça.
— O que era custo de manutenção agora é salário.
— Não temos mais senzalas. Agora, mantemos trabalhadores em vilas operárias.
— Praticamente dentro da fábrica.
— Deixo plantarem seus leirões na várzea do rio. Ocupação nobre para horário de folga, e completam seu sustento.
— Famílias crescem…
— Nascendo filho, com dez anos tenho aprendiz. Menino ocupado, doze horas de descanso para as mães.
Entra o cuidador dos cavalos de raça:
— Coronel, o mijo do Mossoró está escuro.
— Já chamou o doutor?
— Eu pensei…
— Pensou o quê, seu manzanza? Avia!
O cuidador sai.
— Sim, viu? Cuidados e alimentação caríssimos, mas adoecem. É de tirar o sono.
— O senhor tem muito zelo por seus cavalos, não é, coronel?